Política não é para amadores. Não importa quão inteligente, sábia, importante, rica e conhecida uma pessoa seja, nada disso garante que será eleita. E quem quiser discordar sobre ser rica, fique à vontade. Conheço dezenas de casos de pessoas muito ricas que investiram milhões e não foram eleitas. Um bom exemplo disso é o ex-ministro da fazenda de Temer e ex-presidente do Banco Central de Lula, Henrique Meirelles. Segundo informações, Meirelles gastou 54 milhões de reais do próprio bolso na tentativa de se eleger presidente da república em 2018, mas teve apenas 1.288.950 votos. Cada voto custou cerca de 42 reais. E agora mesmo, nessa eleição, o candidato que registrou um patrimônio de 2,8 Bilhões de reais recebeu meros 3397 na cidade de Marília e ficou em 5º lugar na disputa pela prefeitura.
Eleição depende de uma série de circunstâncias, e o dinheiro é só uma delas. As pessoas até buscam as novidades, mas na hora do “vamos ver”, preferem decidir seus votos por questões que nem sempre tem a ver com a própria política. “Tiriricas” que o digam! Nosso povo gosta de favores, de chinelos havaianas, pães com mortadela, gostam de celebridades - podem ser atrizes e atores (até pornô), cantoras e cantores, BBBs, influencers, calouros de programas, protagonistas de memes em redes sociais - e, creiam, até de bandidos. Qualquer um que prometa favores ou qualquer famoso, não importa muito o motivo da fama, tem chances numa eleição quando o eleitor é, na média, um analfabeto político que vota de qualquer jeito, principalmente porque é obrigado a votar.
Quando, por outro lado, o sujeito nasceu com o fiofó virado para a lua, pode ser um torneiro mecânico analfabeto que virou celebridade por organizar greves ou um coach que ficou rico vendendo cursos e fez a proeza de ficar famoso porque se perdeu na mata com um grupo de pessoas, ambos podem acabar chegando lá. Principalmente se o sistema assim o desejar. Mas, quando o sistema não deseja, não há atributos ou eleitorado capazes de eleger alguém. E acredito que Jair Bolsonaro tenha sido o último ponto fora da curva que o sistema não conseguiu impedir. Da primeira vez. Da segunda o sistema foi implacável com ele. Como foi agora com Pablo Marçal.
Reza a lenda que na semana que antecedeu o 7 de setembro, Pablo Marçal teria sido “convidado” para um bate papo com certos urubus, cujo tema era a garantia de que não haveria interferência caso ele avançasse para o segundo turno e até mesmo se caminhasse para vencer as eleições em São Paulo, desde que... Marçal não falasse mal da instituição e nem atacasse seus membros na Avenida Paulista na manifestação. Coincidência, ou não, o candidato embarcou para El Salvador, chegou na Paulista “nos finalmentes”, foi impedido de subir no caminhão de Malafaia (que apesar de ser do Rio de Janeiro, morar lá e votar lá, e o atacou durante toda a campanha em São Paulo) e com isso impossibilitado de fazer qualquer discurso. Dali para a frente, pode buscar em entrevistas, podcasts e debates, ele não falou “gato” em relação ao “combinado”, mesmo quando foi incitado a fazê-lo várias vezes.
Marçal só foi falar que era a favor do impeachment do ministro Senka Belo no podcast Inteligência Ltda, na sexta-feira, véspera da eleição, onde também fez a bobagem de propagar e postar um pseudo-laudo contra seu adversário, que tinha jeito de falso, “cheiro” de falso, cara de falso, cuja própria falta de convicção do candidato já dava pinta de que ia dar ruim. Inclusive postei no meu Instagram a seguinte frase: “Marçal fez uma péssima escolha. Vai custar caro”. E custou. Na mesma noite, e fortemente no sábado, as evidências do “tiro no pé” se alastraram através da imprensa e das redes sociais. Fotos de Marçal com o dono da clínica, testemunho da filha do médico que teria assinado o laudo dando conta de que o falecido pai residia no interior, nunca teria trabalhado na clínica, era hematologista e já estaria aposentado e doente na data inserida no documento. A velocidade com que tais informações vieram à tona fazem até pensar que já se sabia qual era o documento que ele apresentaria e que, tal qual obituário de gente famosa, as informações já estavam prontas para serem divulgadas a fim de jogar a primeira grande pá de cal nas pretensões eleitorais de Marçal.
A história se encerraria na apuração e tudo ficaria por conta do deslize imbecil de um cara que se acha ultra inteligente, mas que, na verdade, mostrou ser mais ultra esperto do que propriamente inteligente, além de arrogante o suficiente para achar que aquela mentira não seria fartamente explorada no momento crucial da eleição. Porém, a derrota de Pablo Marçal não foi traçada apenas na divulgação do laudo falso. Lendo hoje a coluna de Paulo Briguet na Gazeta do Povo, sob o título “Além do laudo: o fato mais grave das eleições de 2024”, como ele mesmo diz, “uma informação passou desapercebido aos olhos da população brasileira”. E faço questão de replicar na íntegra, com o devido link para a matéria completa.
Bom, vou traduzir em uma única frase: Pablo Marçal não levaria a eleição paulistana mesmo que tivesse sido eleito com 100% dos votos. Não seria prefeito de São Paulo mesmo que a população inteira da capital amanhecesse ajoelhada nas ruas no dia da eleição em reverência a seu nome, porque o sistema não quer Pablo Marçal, nem agora e nem num cenário de 2026, para o qual já estão tratando de torná-lo inelegível.
Fazer negócios é diferente de negociar. Fazer política não é um negócio, é negociar. Marçal comprou brigas desnecessárias e com adversários contra os quais não tem força para brigar. Não soube fazer as alianças que deveria, não soube brigar com as armas certas, e se afundou na própria arrogância. E quem achar que ele foi ingênuo em acreditar que conseguiria, ou que esta campanha foi uma semente para 2026, está enganado. Pablo Marçal foi infantil, um Don Quixote sem moinhos de vento e sem um Sancho Pança capaz de trazê-lo para a realidade. O mais certo é que vai ficar para a história.
Cabe ao sistema, agora, decidir quem vai ganhar, Nunes ou Boulos. Nunes representa a maior força política do país, Boulos representa a única chance da esquerda sair menos humilhada nas eleições de 2024. Nunes é o nome do Congresso Nacional (e, creio, do imperador calvo). Boulos é o nome de Lula. Pessoalmente acredito que Nunes vencerá às eleições, mas, a essa altura do campeonato, não me surpreenderia se no segundo turno São Paulo tivesse que encarar um prefeito que tem como maior legado o comando de invasões de propriedade na própria capital paulistana. Só nos resta aguardar. E torcer pelo menos pior.
Mais uma vez, deu m...
P.S. – Apenas por mais uma dessas coincidências com resultados eleitorais comunas na América Latina, quando somamos os votos de Pablo Marçal com os votos de Guilherme Boulos, ao transformarmos em percentual Marçal fica com 49,19% dos votos e Boulos com 50,81%. Fazendo o mesmo raciocínio entre Nunes e Boulos, Nunes fica com 50,35% dos votos e Boulos com 49,65%. Mas, certamente, é mera coincidência mesmo.