Ah, a dosimetria moral — essa nobre invenção tropical que confere ao Brasil não apenas a auréola da impunidade seletiva, mas também o selo “Made in Centrão”. Não foi a Suprema Corte, tampouco o Ministério Público ou os evangelistas de toga que institucionalizaram essa prática refinada de medir pecado com régua torta. Foram eles — os patriarcas da governabilidade a granel, os curandeiros do Congresso Nacional, os xamãs do orçamento secreto — os veneráveis caciques do Centrão.
São eles que, de direita, esquerda, centro, diagonal ou modo avião, operam a balança invisível da moral política. Hoje, canonizam um corrupto por conveniência. Amanhã, excomungam um inocente por falta de alinhamento parlamentar. E o povo? Ah, o povo que reze, porque não há indulgência gratuita fora da planilha do Excel do relator do orçamento.
A dosimetria moral à brasileira não busca justiça, busca equilíbrio contábil: um pecador útil vale mais que um santo inconveniente. Um crápula com quorum é mais bem-vindo que um ético sem bancada. É por isso que nunca saberemos quem escorregou genuinamente na casca de banana da vida, quem mergulhou de cabeça no lodo com gosto, ou quem já nasceu com lama até o pescoço e aprendeu a nadar.
No fundo — e o fundo aqui é sempre mais fundo do que o esperado — todos pecam. A diferença é que uns têm foro, outros têm fôlego, e os melhores têm foto com o presidente da vez.
E assim seguimos: uma República onde a moralidade é medida não por atos, mas por acordos. Onde a penitência é negociada na comissão de ética, e a salvação se compra com cargo em estatal de terceiro escalão.
Afinal, Brasil não é país para principiantes. É para pecadores profissionais.