A possível visita de David Gamble, Coordenador de Sanções do governo Trump, ao Brasil vem sendo alardeada como um movimento direto contra o ministro Alexandre de Moraes e os abusos judiciais cometidos nos últimos anos. Mas é justamente aí que mora o erro: reduzir o gesto diplomático a uma cruzada contra um juiz é enxergar a geopolítica com lentes paroquiais.
Gamble pode até citar Moraes em sua agenda. Pode até escutar denúncias, reunir dossiês e levar anotações debaixo do braço. Mas ele não cruza o hemisfério por causa de um ministro do Supremo, por mais autoritário ou midiático que ele seja. O real objetivo da visita está no eixo geopolítico em que o Brasil decidiu se inserir — e esse eixo inclui China, Irã, Venezuela, BRICS e a erosão das instituições democráticas como pano de fundo.
Sob a gestão Lula III, o Brasil fez acenos e pactos comerciais com nações sob severas sanções americanas, abriu as portas para investimentos chineses em áreas sensíveis (portos, energia, dados) e mantém uma diplomacia ambígua com ditaduras regionais. Não é à toa que os EUA voltaram a olhar para o Brasil não como aliado automático, mas como possível elo fraco de um novo eixo antiocidental.
A presença de Gamble é, antes de tudo, um recado cifrado de Washington: o Brasil está sendo observado. Não se trata de intervir, mas de mapear riscos, pressionar informalmente e deixar claro que a paciência estratégica dos EUA tem limites. Moraes pode ser o pretexto, mas o alvo é bem mais amplo.
É importante lembrar que Eduardo Bolsonaro está autoexilado nos Estados Unidos, alegando risco de prisão no Brasil por discordância política — um fato que, por si só, já é constrangedor para a imagem internacional brasileira. Mas isso, novamente, é parte do quadro, não o quadro inteiro.
A visita de Gamble, se confirmada, é um símbolo de que o Brasil voltou ao centro do tabuleiro geopolítico — mas não pela razão que gostaria. Não é sua pujança econômica, nem sua liderança continental que atraem atenção, mas sim a impressão crescente de que o país flerta perigosamente com regimes hostis ao Ocidente, enquanto desfigura sua própria democracia em nome de um Judiciário sem freios.
Alexandre de Moraes? Pode sobrar pra ele, claro. Mas ele é só uma vírgula. E a frase é muito maior.