Enquanto o país discute PIB, tarifas e promessas bilionárias, uma crise silenciosa devora o futuro das próximas gerações.
Em 2024, o Ministério da Educação (MEC) jogou a toalha e admitiu: 700 mil alunos abandonaram a escola desde 2020, um buraco aberto pela pandemia que ninguém parece disposto a tapar. O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) trouxe números ainda mais duros quanto aos índices de alfabetização no 2º ano do ensino fundamental despencaram para 49,3% em 2023, um retrocesso aos níveis de 2010, quando 48,8% das crianças estavam alfabetizadas, segundo o Saeb histórico.
Em 2025, com orçamento apertado e greves de professores em estados como Rio Grande do Sul e Bahia, o colapso só aumenta. Não é um tema sexy como um cheque gordo do Mercado Livre, mas é o Brasil escorrendo pelo ralo — e ninguém quer mexer nesse vespeiro.
Um Abandono em Números
A pandemia fechou escolas por até 366 dias em estados como a Bahia, conforme o Banco Mundial relatou em 2022. O resultado? Um êxodo escolar que não parou.
O Censo Escolar 2023, divulgado pelo Inep, já apontava 480 mil desistências só naquele ano, com a taxa de abandono no ensino médio chegando a 6,8% — quase o dobro dos 3,5% dos anos iniciais do fundamental. Em 2024, o MEC estimou que o total acumulado desde 2020 atingiu 700 mil alunos, número confirmado em relatório preliminar ao Congresso. Para 2025, com a economia patinando e o desemprego em 8,2% (IBGE, projeção de 2024), especialistas temem que o trabalho infantil e a falta de perspectiva empurrem mais jovens para fora das salas de aula.
O Saeb 2023, publicado em abril de 2025 pelo Inep, mostrou que apenas 49,3% das crianças do 2º ano estavam alfabetizadas, longe dos 60,3% de 2019, antes da pandemia. “Não dá para comparar direto, os métodos mudaram”, disse Manuel Palacios, presidente do Inep, em coletiva. Mas os dados estaduais escancaram o drama - na Bahia, a margem de erro é de 21,5%, e em São Paulo, só 55% das crianças atingiram o padrão básico. É um tombo de uma década, e o futuro não promete subida. O Anuário Brasileiro da Educação Básica 2024, do Todos Pela Educação, alerta- “sem intervenção, o Brasil pode levar 15 anos para recuperar o patamar pré-pandemia.”
Orçamento Magro, Greves e Salas Vazias
Em 2025, o orçamento do MEC enfrenta cortes reais. O Plano Nacional de Educação (PNE) exigia 10% do PIB até 2024, mas o país estacionou em 5,5% em 2022, segundo o Inep, e a projeção para 2025 mal chega a 6%, ajustada pela inflação. Enquanto isso, professores cruzam os braços.
No Rio Grande do Sul, a greve iniciada em março de 2025, liderada pelo CPERS-Sindicato, paralisou 60% das escolas estaduais, cobrando reajuste de 14% contra uma inflação acumulada de 4,5% (IPCA). Na Bahia, o APLB-Sindicato interrompeu aulas em abril, após o governo estadual oferecer 3% de aumento contra perdas salariais de 20% desde 2020. “Sem salário, não tem aula”, resume Maria Silva, professora em Salvador.
A infraestrutura também afunda. O Censo Escolar 2023 mostrou que só 60% das escolas públicas têm internet, caindo para 48,5% no Norte e Nordeste. Em 2024, o MEC prometeu R$ 4 bilhões até 2026 para o Pacto Nacional pela Retomada de Obras, mas apenas 25% foi liberado até agora, segundo o Portal da Transparência. “Minha escola não tem ventilador, imagina computador”, diz João, 14, aluno em Porto Alegre. O calor de 35°C no verão e a falta de professores — só duas aulas de química em dois meses, segundo o Global Issues (2024) — afastam quem ainda insiste em estudar.
O Custo do Abandono
O colapso vai além das carteiras vazias. O Banco Mundial estima que cada ano perdido na educação básica custa ao Brasil 0,5% do PIB futuro — cerca de R$ 50 bilhões anuais em 2025. Crianças não alfabetizadas viram adultos sem qualificação, engrossando os 47,1% de jovens de 15 a 29 anos que abandonam os estudos por trabalho ou desinteresse, segundo o IBGE (2023). Para meninas, a gravidez responde por 23,1% das evasões, um ciclo que a escola em tempo integral, promessa do MEC com 3,2 milhões de vagas até 2026, tenta quebrar — mas só 500 mil foram criadas até agora.
O programa Pé-de-Meia, lançado em 2024, paga R$ 200 mensais a alunos pobres do ensino médio com 80% de presença. Mas vamos falar a verdade, é uma furada. O retorno às escolas não vem pelo conhecimento, porque os conteúdos são precários e os professores, cada vez mais doutrinadores, empurram ideologia em vez de ensinar o que realmente irá formar pensadores. Os alunos voltam pelo dinheiro, num sistema onde a educação é de péssima qualidade, como mostram os índices do Saeb. E isso num país onde as famílias mais pobres mal conseguem pagar comida e luz, gritando por necessidades básicas diante de um cenário econômico caótico e tão descolado da realidade que parece outro planeta. Em 2025, o MEC prevê atingir 4 milhões de estudantes com o programa, mas o orçamento de R$ 9,2 bilhões por ano depende de cortes em outras áreas, como a merenda escolar, já reduzida em 10% em 2024.
Quem Vai Consertar Isso?
O governo Lula fala em “segurança educacional”, mas as ações patinam. O ministro Camilo Santana anunciou em janeiro de 2025 a fusão do Saeb com o Enem para avaliar o ensino médio, mas os resultados só vêm em 2026. Enquanto isso, o Brasil investe US$ 4.306 por aluno, contra US$ 11.560 da média da OCDE (Education at a Glance, 2023). “Um país desenvolvido prioriza educação”, disse Santana. Mas, no chão das escolas, a prioridade parece outra. “A gente quer aprender, mas como, se falta tudo?”, pergunta Ana, 12, de Feira de Santana (BA).
Não é um investimento vira manchete, nem uma briga internacional que mobiliza Brasília. É só o futuro do país indo embora, um aluno de cada vez. E, por enquanto, ninguém quer encarar esse vespeiro.