NÃO, ERIC, NÃO É PARA SEMPRE.
... O papel para escrever e pintar parece ter ficado mais duro e absorve muita tinta, que pelo clima árido, está secando; e a pena, devido ao atrito com o material mais ríspido, começa a demonstrar grande desgaste.
Contudo, de modo improvável, as mãos do artista e as do escritor, ainda que cansadas, resistem heroicamente.
E como numa peça de ficção, a realidade desse povo se confunde nos seus múltiplos cenários impostos e nas surpresas dolorosas desse novo ciclo, que na verdade, não é tão novo assim.
Há de se ressaltar no entanto, a incrível capacidade emocional e a resiliência desses artistas humildes tão vilipendiados, de não cederem ao "pincel vermelho" que tenta pintar tudo de sangue, afim de tirar de cena para sempre, a vida, o brilho e a obra desse povo-artista.
Não há nada que possa ser celebrado nessa guerra psicológica de perseguição e desdém. É um ciclo de obras destruidas, de famílias órfãs, de quadros que foram jogados no porão e, por causa da humidade, perderam a cor e o brilho natural. Normalmente era para ter um final melancólico e desolador. E seria facilmente entendido, afinal quem resiste a tanta dor?
Quem pode absorver tantos socos e pontapés injustos?
A "bota do futuro pisando no rosto humano" de artistas pueris prometidas na ficção de Eric Arthur Blair (Orwell), ultrapassou as páginas da imaginação e virou um pesadelo real.
Por razões um tanto complexas, quase toda a população foi levada a aceitar o regime-novo como ‘democrático’, embora reconheça em silêncio que a essência e a prática são inteiramente diferentes de tudo que significa ‘Estado Democrático de Direito’.
Na verdade, o que há é uma espécie de sistema de pensamento jurídico esquizofrênico, no qual palavras como ‘democracia’ são usados como a ponta da lança que vai envenenar a própria democracia. Somente uma parte insiste em falar, ainda que não haja eco da voz: a parte do povo-artista.
E o que é mais curioso é que, boa parte do povo que hoje apoia a destruição dos artistas de biblia-na-mão e amantes da bandeira nacional, rechaçavam as botas ativas das décadas entre 1960 e 1980, pois eram eles os alvos. Hoje, exatamente 60 anos depois, riem-se na TV, criam materialidade com mentiras e ilações e, com sugestões dadas pelos próprios destruidores de quadros que, hoje já não usam apenas as botas de Eric, mas capas de Batman.
Se o período de proibição e repressão de outros tempos, durou 21 anos, hoje, com todo avanço civilizatório e com a conscientização do povo, mas sobretudo em virtude da fé e da resiliência dos novos pintores, tende a durar bem menos.
E se há mãos que foram amarradas e vozes que foram caladas, há ainda muitas mãos pintando e escrevendo, outras mãos entalhando em rochas, as informações que não poderão ser apagadas. Então, apesar da cor nublada nos rostos de muitos, apesar do Natal dolorido para crianças e esposas, com toda a crueldade imposta pelo regime-novo, há de se encontrar na fé em Deus o refúgio certo até que passe as calamidades.
Não é para sempre. E eu, que faço parte desses novos artistas, estou certo que alguma coisa vai acontecer. Acredito que mãos equilibradas pintarão um novo quadro e que repressores serão forçados a recuar. Pode parecer que não, mas há artistas(embora tímidos) que usam a mesma tinta que nós, espalhados nas repartições públicas, nos jornais e na Justiça. E ainda temos outros que são autônomos e independentes e que fazem excelentes quadros.
Temos vozes que começam a perceber a bota se aproximando do rosto e estão começando a pegar o pincel para escrever ou pintar a realidade a respeito da metodologia governamental do regime-novo.
Força senhores, peguem os vossos pincéis, usem a tinta que resta e abram a vossa boca, não é tempo de desistir, senhores.
É pelos nossos filhos e nossos netos. Talvez soframos e até morramos, mas os nossos novos artistas serão livres e farão desse país uma obra realista e invejável. Até a próxima temporada, amigos.
Sergio Junior
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