O místico Duns Scot foi um teólogo e filósofo escocês.
Foi, tão só, um dos três filósofos-teólogos mais importantes da Europa Ocidental, na Alta Idade Média, juntamente com Tomás de Aquino e Guilherme de Ockham, mas poucos de vós, com certeza, ouviram falar dele ou souberam de sua existência – pois é, um padrão que se repete em loopings historicistas de espaço / tempo...
Em 1300 ensinou teologia em Oxford e em 1305 doutorou-se na disciplina, desta feita, já em França.
Seus escritos são numerosos, porém não deixou uma suma. Muitas das suas ideias são encontradas espalhadas por diversos trabalhos, alguns deles incompletos, o que tem dificultado, até hoje, uma mais que necessária incrementação antológica de sua doutrina.
Sua obra principal é a famosa Opus Oxoniense.
Nela ele disserta sobre o seu princípio de Univocidade a partir do qual o pensador negava uma distinção real entre essência e existência, opondo-se, portanto, à doutrina tomista que primava pela lei da analogia.
Para ele, não podemos conceber o que é ser algo sem conceber esse algo existindo realmente.
Que não se pode fazer uma distinção entre se uma coisa existe (si est) e o que ela é de fato (quid est).
Na citada obra Scot discorre, também, sobre as Provas da existência de Deus.
Em sua visão, há, de forma evidente na realidade, as coisas criadas e as coisas incriadas.
Todos os seres da realidade, que não Deus, são seres evidentemente finitos, porque limitados e carentes da plena perfeição.
Os seres possuem uma causa e um efeito, contêm limites e fronteiras, e por isso são contingentes.
As coisas criadas podem ser vistas e constatáveis por nós mesmos: o ser humano que nasce e morre, a árvore que brota e seca…
As coisas incriadas, por sua vez, só podem ser inferidas e aferidas pelo intelecto, pela dedução, cognição e consciência.
Como mostrava Parmênides (reverenciado aqui pelo teólogo), “nada advém do nada, pois o nada não pode ser coisa alguma, logo o ser sempre é. Se o ser não fosse, em algum instante, haveria o nada, e já que do nada, nada pode advir, o ser é, portanto, infinitamente”…
Argumenta Scot que Deus é, então, a Entidade infinita, ilimitada, acontigente, incondicionada e infinitamente perfeita – o Ser em sua intensidade absoluta e ato puro…
“É possível um ser por outrem? (Indagava-se e respondia o ermita)
A experiência mostra que sim.
E é possível um ser por si?
Se é possível, existe em si mesmo”.
Caso contrário, teremos a série infinita de causas que Scot, através de diversos argumentos, demonstra ser impossível:
“É impossível, portanto, não haver um ser incausado” - esta é a derradeira conclusão a que chega Scot.
Para ele “o Ser é conhecido por si, e a infinidade não lhe é contraditória, pois ela é perfeitamente inteligível. Há, portanto, compatibilidade entre infinitude e o ser; e se a infinidade é uma perfeição possível, o ser supremo, que é Deus, é necessariamente infinito”.
Por outras palavras, o que pode ser pensado e / ou consciencializado está em Deus.
E Deus é aquele que não podemos conceber outro maior, pois nada pensado pela mente pode ultrapassar o Supremo Ser…
Ainda em Opus Oxoniense ele se debruça sobre o conceito de Distinção Formal.
Segundo Scot, o Homem possui, via alma, a intuição direta das essências dos entes, capacidade, essa, que teria sido perdida através da queda dos anjos, primeiro, e pelo Pecado Original, depois. Os seres humanos, herdeiros do fado de Adão, encontrar-se-ão, pois, em um status naturae lapsae, estado de natureza decaída, e esta é, segundo o franciscano, a razão de haver diversas distinções de conhecimento entre a nossa mente e a realidade.
Havia na escolástica de sua época, e nas antecedentes, duas distinções fundamentais na teoria do conhecimento: a distinção real (distinctio realis) que existe realmente entre dois seres na natureza; e a distinção de razão (distinctio rationis) que se dá entre dois seres na mente do sujeito que conhece.
O que Scot fez foi formular um terceiro nível de distinção, como um meio-termo entre as duas anteriores – a distinção formal (distinctio formalis) que ocorre na formalidade do ente percebido, não tendo origem nem propriamente real nem propriamente mental.
A triangularidade e a quadrabilidade, por exemplo, são formalidades distintas, mas não são por si entes reais com existência física; existem como formas de entes reais, mas têm realidade factual. Trata-se aqui, portanto, de uma distinção real-formal.
De acordo com o franciscano, um homem possui várias formas, como a humanidade, a animalidade, a racionalidade, etc..., mas, em última instância, possui uma forma que lhe é única, que lhe permite ser distinto, ser ele mesmo. Esta é a distinção formal à qual Scot deu o nome de haecceitas, a "estidade" do ente, a qualidade dele ser "tal coisa" (haec res) e não ser outra, ou seja, a sua individualidade.
Deste último conceito ele parte para a contraposição à Universalidade – Scot opunha assim a haeeceitas à natura communis.
Para ele, só existe o individual, e isto é um axioma fundamental e a chave para a plena compreensão da realidade.
Para apreendermos um individual é necessária a cognição intuitiva que nos dá a existência ou não existência atual (presente) do individual, oposta à cognição abstrata, universalista.
Muitos afirmam que esta posição de Scot foi a grande responsável pelo fortalecimento do nominalismo e a derrubada do realismo moderado aristotélico-tomista, no findar da Idade Média. Descartes, Leibniz, Hobbes, Kant e tantos outros modernos teriam sido, assim, herdeiros da filosofia escotista.
Como podereis constatar, Duns Scot, com um pensamento ao mesmo tempo sutil e notável, acabou sendo uma influência e o holofote para muitos louvados e consagrados.
Em suma, Scot argumenta sobre a prova da existência de um princípio absolutamente simples que seria Primal na ordem de causalidade eficiente e final.
Em seguida, demonstra que esse Ente absolutamente simples é Plenamente Primeiro, pois que primaz em eficiência, finalidade e eminência.
Também procura provar que essa tríplice primazia cabe a uma única natureza – DEUS.
Portanto refere-se a um Único Ente descrito como Infinito, pois o primeiro em causalidade só pode causar a si mesmo e ser causa por si mesmo, não sendo causado por nada externo.
E que tal Ente só pode ter a Si Mesmo como finalidade, pois, do contrário, não seria primeiro...
Mastigando e digerindo para vós resumiria tudo o que lestes nos seguintes moldes:
Se o Transcendente existe, ele fará parte da realidade – certo?
Logo, se vós quereis entender a realidade, necessariamente, precisareis abrir-vos a Ele.
Pois que, se não o fizerdes, tereis apenas uma visão retalhada – e, por ordem de razão, deturpada e / ou falseada – da Verdade.
Não por acaso a perpétua e quimérica visão de massa em todas as eras e impérios...
Eco