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INVESTIMENTO BILIONÁRIO DO MERCADO LIVRE

SALVAÇÃO ECONÔMICA OU FOGO DE PALHA?

Maria Rosa M Pires
Por: Maria Rosa M Pires
08/04/2025 às 11h25 Atualizada em 08/04/2025 às 12h26
INVESTIMENTO BILIONÁRIO DO MERCADO LIVRE

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva não escondeu o entusiasmo ao visitar a sede do Mercado Livre em São Paulo na última semana. Com pompa e circunstância, anunciou um investimento de R$ 34 bilhões da gigante do e-commerce no Brasil, prometendo dobrar o número de empregos diretos gerados pela empresa — de 17 mil para cerca de 34 mil, segundo estimativas. “É um sinal de confiança no nosso país”, declarou Lula, em meio a um cenário global de tensões comerciais, com Donald Trump ameaçando tarifas de 50% contra a China e respingos que podem atingir o Brasil. Mas, enquanto o governo celebra, fica a pergunta que não cala: como isso vai impulsionar a economia se o desemprego e a dependência de assistencialismo só crescem? E, vai mesmo gerar essa quantidade de empregos ou é só mais um número 'jogado ao vento' apenas para gerar expectativa?

Os números pintam um quadro menos otimista. Segundo o IBGE, no último trimestre de 2024, o Brasil tinha 8,2 milhões de desempregados, sem contar os 38 milhões na informalidade ou os 25 milhões de beneficiários do Bolsa Família — este último, dado do Ministério do Desenvolvimento Social. São 34 mil novas vagas contra uma montanha de necessidades. “É como oferecer um copo d’água para apagar um incêndio”, diria alguém nas ruas, onde o povo está mais preocupado em pagar luz, água, aluguel e comida do que em comprar o mais novo smartphone no Mercado Livre.

O plano da empresa argentina é ambicioso: expandir centros logísticos, contratar motoristas, estoquistas e desenvolvedores de tecnologia. Mas quem vai preencher essas vagas? Dados do Caged mostram que, em 2024, os empregos formais cresceram 2%, mas concentraram-se em grandes cidades como São Paulo e Rio, enquanto o desemprego estrutural castiga o interior e as periferias. Para os mais pobres, sem qualificação ou acesso a transporte, a promessa de um emprego no Mercado Livre pode soar como um sonho distante.

E tem mais, o modelo de negócios do e-commerce depende de consumo. Em 2023, o gasto médio das famílias brasileiras com itens essenciais (alimentação, moradia, saúde) já consumia 78% da renda das classes D e E, segundo a FGV (Fundação Getúlio Vargas). Sobravam migalhas para supérfluos — aqueles produtos que enchem os catálogos virtuais. Na classe média, o medo de emergências faz o dinheiro ficar guardado, não gasto. Então, como esse investimento bilionário vai aquecer a economia se o bolso do brasileiro está preso ao básico?

O governo parece mirar no longo prazo, usando o anúncio como trunfo político contra as tarifas americanas e a desconfiança internacional. Mas o curto prazo é cruel, pois a inflação de alimentos subiu 4,5% em 2024, conforme o IPCA, e o preço da energia elétrica acumula alta de 12% em dois anos. “O povo quer comida na mesa, não promessas de emprego que não chegam”, resume Maria Silva, 42 anos, moradora de uma comunidade em Guarulhos (SP), que vive de bicos e do Bolsa Família.

Não é que o investimento seja inútil — 34 mil empregos são bem-vindos. Mas, sem políticas que redistribuam renda ou barateiem o custo de vida, o impacto pode ficar na superfície, beneficiando mais quem já consome online do que quem luta para sobreviver. Enquanto Lula posa para fotos com executivos, o Brasil real segue perguntando: “E eu, quando vou sentir esse impulso na minha vida?”.

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