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Opinião 8 de janeiro

O ADVOGADO É A SOLA DA BOTA DO JUDICIÁRIO

OAB submissa ao STF

20/09/2024 às 18h42
Por: Ana Maria Cemin
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Arquivo pessoal
Arquivo pessoal

A declaração é do advogado Francisco Weber da Rocha, 37 anos, que defende a presa política Karine Cagliari Villa, 40 anos. Ambos são de Caxias do Sul, RS, e aguardam o desfecho do processo que tornou Karine ré por estar no QG de Brasília na manhã do dia 9 de janeiro de 2023.

Vamos à entrevista, de forma corrida, pela voz do próprio advogado.

“A Karine chegou para mim por meio de pessoas conhecidas que não estavam conseguindo ter contato com ela e acompanhar a sua prisão. Falei para essas pessoas que era importante ir pessoalmente a Brasília e falar com Karine no presídio, até para tranquilizá-la de que aqui fora as pessoas estavam procurando soluções para ela.

Foi uma decisão acertada, porque assim entendi o que realmente estava acontecendo. Até então as informações que eu tinha eram as da televisão. E o que presenciei só confirmou o que venho falando há pelo menos dez anos: o nosso Poder Judiciário está falido, perdeu a sua importância e o seu fim.

Os ministros do Supremo Tribunal Federal nos mostram que a maior corte do nosso Brasil é um tribunal político, sendo que o judiciário jamais deveria ter um viés político. Isso que vi lá, também vejo aqui nos tribunais de Caxias do Sul e Porto Alegre.

A experiência mostrou que nenhum tipo de prerrogativa e direito dos advogados está sendo observado nesses inquéritos. Tudo é burocracia para conseguir acessar processos e tem coisas que até hoje a gente, como advogado, não teve acesso.

Para se ter uma ideia, esse o inquérito policial que gerou a prisão de Karine é derivado do Inquérito do Fim do Mundo, o 4.871, que foi instaurado pelo STF e está relacionado com fake News, ataques à democracia e ameaça às instituições. Então a gente percebe que os inquéritos abertos em 8 de janeiro fazem parte de algo muito maior, do qual as pessoas não têm nem noção.

Me refiro inclusive a advogados que trabalham no processo dos presos políticos que nem têm noção dessa relação. Tudo o que estamos assistindo vem muito antes do 8 de janeiro, inclusive políticos foram presos, sofrem ações, que os seus advogados até hoje também não tiveram acesso ao inquérito.

No caso específico de Karine, fui a Brasília para ter acesso a ela e acabei entendendo que além de toda essa situação criada pelo judiciário houve uma outra situação criada por advogados que, no momento de desespero das pessoas que foram ao Ginásio da Polícia Federal e presídios, se aproveitaram da situação. A gente sabe de casos terríveis, de absurdos que aconteceram e que acabam depondo contra a classe da advocacia.

Quando a Karine me viu e associou que eu tinha saído de Caxias do Sul para estar ali para atendê-la, a pedido dos familiares e amigos que estavam se mobilizando para auxiliar, isso foi importante para ela.

Aquele momento inicial era de muitos boatos e de criação de esperanças para os presos sem fundamentação. Eu deixei muito claro para a minha cliente, desde o primeiro momento, que estávamos lidando com uma situação muito complicada, no qual o Supremo se posicionou como vítima, acusador e julgador.

Eu entendo que a gente não terá outro desfecho nesse processo que não seja a condenação de todos. Inclusive é importante ressaltar que as prisões se deram com fundamentação em crimes que depois, na denúncia da Procuradoria Geral da República (PGR), não se confirmaram. Sendo assim, todos foram presos por tentativa de abolição do sistema e golpe contra o estado, mas na denúncia da Karine as acusações foram mais brandas, que inclusive não poderiam ensejar a prisão dela.

MÃE DE MENOR NÃO PODE SER PRESA

Outra questão a ser destacada sobre o caso de Karine é que ela tem uma filha pequena e um menino pré-adolescente, e na nossa legislação está claro que uma mulher nessa condição, com filhos que dependem dela, que ela sustenta, não poderia ter ficado presa por 60 dias como ficou em Brasília.

A questão é que o julgador do processo, o Supremo, nem lê o que a gente junta de documentação. Ignora o processo em si.

A Karine chegou no dia 8 de janeiro e almoçou no Centro de Tradições Gaúchas que tem no distrito federal, foi à tarde até a Praça dos Três Poderes, mas não entrou em qualquer local e de lá foi encontrar o noivo que já estava no QG. Ficou com ele naquela noite e na manhã seguinte ninguém pode sair do local e foram presos.

FALÊNCIA DO JUDICIÁRIO

Como advogado, eu entendo que o 8 de janeiro deixou clara a falência do nosso Poder Judiciário e vejo o Brasil caminhando a passos largos para uma situação de desequilíbrio total, com um Judiciário legislando (o que não é de hoje). Por outro lado, temos um Legislativo acadelado (palavra usada pelos gaúchos que significa perda de coragem), e a gente sabe o porquê disso, que por trás desse comportamento tem, inclusive, trocas de favores.

Quem foi a Brasília se manifestar, e creio que 80% dos que foram à Praça dos Três Poderes eram de fora, queriam voltar para casa. Mas quem ficou no QG foi cercado e impedido no seu direito constitucional mais básico que é o direito de ir e vir.

Essas pessoas não foram informadas que estavam sendo presas e foram obrigadas a entrar em ônibus no dia 9 de janeiro. E reza a lenda  que ficaram passeando com elas na cidade, em situação constrangedora, humilhante, difícil de ser comparado com alguma ocorrência semelhante na história de nosso País.

Essas pessoas sofreram torturas físicas e foram exibidas como troféus.

Pelas nossas leis, a Audiência de Custódia deve ocorrer em 24 horas e muitas dessas pessoas tiveram a audiência somente três dias depois. Diante de tantas inconstitucionalidades, de comprovações que legislação não foi seguida no 8 de janeiro, então a gente pode rasgar e jogar fora o que se entende por lei porque não têm mais função.

INSTITUIÇÕES POLITIZADAS

Hoje, a gente tem uma Procuradoria Geral da República e um Ministério Público Federal totalmente politizados, com um viés muito específico, com um espectro muito definido, que protege o status do próprio governo.

Porém, o que se espera do Ministério Público é que ele seja um órgão independente.  

Nesse caso do 8 de janeiro a gente viu um Ministério Público ferrenho no sentido de querer penalizar essas pessoas a qualquer custo, inclusive passando por cima da própria Constituição Federal. Atua em parceria com o STF: ao invés de atuarem como guardiões das leis, eles agem como guardiões deles mesmos.

Eu acredito que a intenção é causar medo na população brasileira. É uma ditadura que está em vigência no Brasil. Estamos sob um regime de exceção.

Minha cliente saiu do presídio de Brasília e até hoje usa tornozeleira eletrônica, com os seus direitos básicos restritos. Inclusive, aos finais de semana ela não pode sair de dentro de casa. Ela, como uma pessoa religiosa, não pode frequentar a igreja, não pode ir à farmácia, não pode levar os filhos para um parque para brincar no final de semana. Se isso não é perseguição política, tortura, então não sei o que é.

JULGAMENTO

A Karine já teve audiência de instrução e a previsão de quando sairá o julgamento não existe. O prazo no Judiciário existe só para os advogados. Juiz, desembargador e ministro não têm prazo.

Quanto ao resultado do julgamento a gente já sabe: será a condenação. De todos os mais de 200 julgados até agora somente um mendigo foi inocentado, porque a advogada conseguiu provar que ele é de esquerda e estava no local como curioso. O nível dos policiais que prenderam mendigos, baleiros, vendedores de algodão doce, motoristas de aplicativo é assustador.

A situação é toda tão absurda que numa das visitas do STF ao presídio, os ministros tiveram a audácia de dizer para as presas políticas que se elas estavam lá no Colmeia era porque os advogados delas não estavam trabalhando. E a gente é obrigado a engolir isso e a Ordem dos Advogados do Brasil fica calada, completamente submissa e subjugada ao STF.

Em tese não existe hierarquia entre advogado, juiz e promotor. Em tese estaríamos todos na mesma linha. Mas diante de tudo o que assistimos no Brasil a gente sabe que isso é a maior inverdade contada no Curso de Direito para os estudantes.

Mentira! A gente tem que parar de mentir para os estudantes e continuar formando advogado a rodo que vai se deparar com uma realidade na qual ele, no conjunto jurídico, é apenas a sola da bota. Inclusive a OAB está pisando no advogado, quando deveria  brigar pelas nossas prerrogativas.”

 

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Ana Maria Cemin
Ana Maria Cemin
Sobre Ana Maria Cemin, jornalista com ampla experiência, conservadora, colaborativa com causas sociais de importância para a sociedade, dedicada na divulgação dos fatos para conhecimento das pessoas sem meias verdades. Também administradora do http://www.bureaucom.com.br/
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