Ressurgimento da Coqueluche no Brasil e no Mundo
Dra. Solange Lessa Nunes, Biomed; MsC.; PhD; PPhD*.
Introdução
A coqueluche, também conhecida como pertussis, é uma doença infecciosa respiratória causada pela bactéria Bordetella pertussis. Apesar de ser uma doença controlada pela vacinação, nas últimas décadas, tem-se observado um ressurgimento dos casos em várias partes do mundo, incluindo o Brasil. Este artigo tem como objetivo discutir as possíveis razões para esse ressurgimento, bem como as implicações para a saúde pública e estratégias de controle.
Histórico e Epidemiologia
A coqueluche foi uma das principais causas de mortalidade infantil antes da introdução da vacina nos anos 1940. Com a implementação de programas de vacinação, os casos diminuíram drasticamente. No entanto, a partir dos anos 1980, observou-se um aumento gradual dos casos em diversos países desenvolvidos e em desenvolvimento.
Situação no Mundo
Nos Estados Unidos, por exemplo, houve um pico significativo em 2012, com mais de 48.000 casos reportados, o maior número desde 1955 (Centers for Disease Control and Prevention, 2013). Na Europa, países como o Reino Unido e a Alemanha também relataram aumentos nos casos de coqueluche, apesar de altas taxas de cobertura vacinal (WHO, 2015).
Situação Atual no Brasil
No Brasil, o aumento dos casos de coqueluche tem sido notado desde a década de 2000. Em 2014, houve um surto significativo com mais de 8.000 casos confirmados, a maioria em crianças menores de um ano (Brasil, 2015). A cobertura vacinal no Brasil é geralmente alta, mas variações regionais e falhas na vigilância epidemiológica podem contribuir para surtos.
Possíveis Causas do Ressurgimento
1. Evolução da Bactéria
A Bordetella pertussis tem demonstrado uma capacidade de evolução, com surgimento de cepas que podem escapar da imunidade conferida pela vacina (Mooi, et al., 2014).
2. Diminuição da Imunidade
A imunidade conferida pela vacina acelular, atualmente utilizada, parece diminuir mais rapidamente do que a conferida pela vacina de células inteiras usada anteriormente (Witt, et al., 2012).
A vacina DTPa (difteria, tétano e pertussis acelular) é usada para proteger contra três doenças bacterianas graves: difteria, tétano e coqueluche (pertussis). Aqui está uma visão geral de cada componente: 1. Difteria: infecção bacteriana que afeta principalmente as membranas mucosas da garganta e do nariz. Pode causar dor de garganta, febre, inchaço dos gânglios linfáticos e fraqueza. Em casos graves, pode levar a dificuldades respiratórias, insuficiência cardíaca ou morte. 2. Tétano: Causado por uma toxina produzida pela bactéria Clostridium tetani, que pode entrar no corpo através de cortes ou feridas. A toxina causa rigidez muscular e espasmos dolorosos, geralmente começando nos músculos do maxilar (trismo). O tétano pode ser fatal se não tratado. 3. Coqueluche (pertussis): Uma infecção respiratória altamente contagiosa, caracterizada por crises severas de tosse que podem dificultar a respiração, especialmente em bebês e crianças pequenas. A coqueluche pode levar a complicações graves, como pneumonia, convulsões e danos cerebrais.
A vacina DTPa confere benefícios pela proteção combinada, conferindo imunidade contra três doenças em uma única injeção. Outro fator bastante importante é com relação a segurança: DTPa usa componentes acelulares da bactéria pertussis, o que reduz os efeitos colaterais em comparação com a vacina DTPw (componente celular). E o mais relevante se refere a prevenção de surtos, vacinar a população ajuda a prevenir surtos dessas doenças, protegendo também aqueles que não podem ser vacinados por motivos médicos (imunidade de grupo).
3. Cobertura Vacinal Incompleta
Em algumas regiões geográficas, incluindo nosso território, a cobertura vacinal pode não ser suficiente para manter a imunidade de grupo, permitindo a circulação da bactéria.Tal motivo, tem aumentado a preocupação da circulação e o comentado aumento de casos no mundo.
Com a aproximação das Olimpíadas de 2024, o Royal College of General Practioners (RCGP), em Londres, liberou no dia 7 de junho do corrente ano, diretrizes alertando para o aumento de coqueluche (pertussis) e sua possível circulação no evento olímpico sediado em Paris. Atribuindo o aumento de casos e eventual circulação à baixa adesão ao calendário vacinal bem como orientando a vigilância sanitária atenção aos principais sintomas, que são: tosse convulsa, que inclui ataques de tosse ou tosse incessante, nariz escorrendo e possível dificuldade em respirar. Outras futuras orientações estão referenciadas dentro de guias propositivos pelas vigilâncias locais e internacionais de saúde como o CDC e a Agencia de Segurança em Saúde do Reino Unido.
4. Diagnóstico e Notificação Melhorados
Melhorias nos métodos de diagnóstico e na vigilância epidemiológica podem resultar em maior detecção e notificação de casos (Cherry, 2012).
As principais implicações para a saúde pública com o ressurgimento da coqueluche apresentam desafios significativos para a saúde pública. A doença é particularmente perigosa para lactentes, que são mais suscetíveis a complicações graves e morte. Portanto, é crucial garantir a vacinação adequada, especialmente entre mulheres grávidas.
No Brasil a DTPa, consta do PNI (Programa Nacional de Imunização), desde 2014 oferecida pelo Sistema Único de Saúde (SUS), sendo aplicada uma dose a partir da 20ª semana de gestação ou em puérperas até 45 dias caso a vacina não tenha sido administrada durante a gestação (Brasil, 2024), a importância da imunização durante a gestação serve para proteger os recém-nascidos por meio da imunização passiva (Healy, et al., 2011).
Estratégias de Controle
As principais estratégias de controle sugeridas seguem:
1. Vacinação de Reforço: implementação de doses de reforço para adolescentes e adultos jovens para aumentar a imunidade da população.
2. Vacinação de Grávidas: promoção da vacinação de mulheres grávidas para conferir imunidade aos recém-nascidos.
3. Monitoramento e Vigilância: fortalecimento dos sistemas de vigilância para detectar e responder rapidamente aos surtos.
4. Educação e Conscientização: campanhas educativas para aumentar a conscientização sobre a importância da vacinação.
Conclusão
O ressurgimento da coqueluche no Brasil e no mundo é uma preocupação significativa para a saúde pública. É necessário um esforço contínuo para manter e melhorar as estratégias de vacinação, vigilância epidemiológica e educação para controlar a disseminação da doença.
Espero que este artigo ajude a fornecer uma visão abrangente sobre o ressurgimento da coqueluche e sirva como uma base sólida para discussões futuras e ações de saúde pública.
Referências Bibliográficas
1. Brasil (2024). Vacina adsorvida difteria, tétano e pertussis (acelular) (dTpa). Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/d/dtpa. Acesso em: julho/2024.
2. Centers for Disease Control and Prevention (CDC). Pertussis (Whooping Cough) Outbreaks, 2013. Disponível em: https://www.cdc.gov/pertussis/php/surveillance/index.html. Acesso em: julho/2024.
3. World Health Organization. (2015). Pertussis. Disponível em: https://www.who.int/immunization/diseases/pertussis/en/Ministério da Saúde. (2015). Boletim Epidemiológico - Coqueluche. Acesso em: julho/2024.
4. Mooi, F. R., Van Der Maas, N. A., & De Melker, H. E. (2014). Pertussis resurgence: waning immunity and pathogen adaptation - two sides of the same coin. Epidemiology and Infection, 142(4), 685-694.
5. Witt, M. A., Katz, P. H., & Witt, D. J. (2012). Unexpectedly limited durability of immunity following acellular pertussis vaccination in preadolescents in a North American outbreak. Clinical Infectious Diseases, 54(12), 1730-1735.
6. Cherry, J. D. (2012). Epidemic pertussis in 2012—the resurgence of a vaccine-preventable disease. New England Journal of Medicine, 367(9), 785-787.
7. Healy, C. M., Rench, M. A., & Baker, C. J. (2011). Importance of timing of maternal combined tetanus, diphtheria, and acellular pertussis (Tdap) immunization and protection of young infants. Clinical Infectious Diseases, 53(9), 885-892.
8. UK Health Security Agency. Whooping cough cases continue to rise. Disponível em: https://www.gov.uk/health-and-social-care/health-protection-infectious-diseases. Acesso em: maio/2024.
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