Se Platão tivesse ouvido “Carruagens de Fogo” interpretada pela Filarmônica de Berlim, talvez a caverna de sua alegoria tivesse uma janela com vista para o Olimpo. Agora, imagine a mesma caverna, porém adornada com luzes de LED piscando ao som de um batidão funk. De repente, o fogo que iluminava a verdade foi substituído pelo “DJ Solta o Beat”. Bem-vindo à Kali Yuga mental.
Enquanto gênios como Ravel, Mozart e Vangelis criavam trilhas sonoras para a alma, o Funk Carioca, com sua sutil poesia que rima “sentadão” com “raladão”, oferece um manual de instruções para a entropia cultural. Não me leve a mal, o batidão tem sua função social. É o toque de recolher mental, um hino ao minimalismo cognitivo. Afinal, para que sinapses em pleno século XXI? Melhor deixar o córtex pré-frontal descansar ao som de “Vai no chão, vai no chão”.
O curioso é que vivemos na era onde o politicamente correto é tão rígido quanto as regras do bolero, mas o Funk parece ter a imunidade diplomática da baixa expectativa. Qualquer tentativa de crítica se choca com um “é cultura periférica”, e aí está o passaporte para o Panteão da Kali Yuga. Aquele mesmo lugar onde as musas da inspiração clássica agora fazem twerk ao som de um remix.
Enquanto “Carruagens de Fogo” nos levava em uma jornada de superação e glória, o Funk Carioca nos convida a um “rolezinho” na pracinha, onde a orquestra é substituída pelo “pancadão” e os solistas fazem performance com o copo de plástico na mão. Imagine se Beethoven ouvisse o batidão: provavelmente o silêncio eterno seria ainda mais atrativo.
Assim seguimos, marchando ao ritmo da Kali Yuga mental, onde o ponto mais alto da sinfonia é o agudo do MC e a plateia aplaude ao som do “ai se eu te pego”. O progresso? Ah, esse foi para o after, mas só volta se o DJ deixar.